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A imperativa transparência nas arbitragens com a administração pública

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    Instituto Não Aceito Corrupção
  • 25 de abr.
  • 4 min de leitura

 

O parâmetro da transparência é elevado a ponto de a ONU possuir norma específica sobre o tema: a Convenção das Nações Unidas sobre Transparência na Arbitragem entre Investidores e Estados Baseada em Tratados (Nova York, 2014)

 

Por Raquel Marangon

25/04/2025 | 12h55

 

A observância aos parâmetros de governança e a manutenção da integridade das relações público-privadas estão em pauta nos cenários nacional e internacional. No Brasil, o arcabouço normativo que rege a interação entre a administração pública e a iniciativa privada autoriza a escolha de formas diversas da via estatal de solução de conflitos.

A Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021), especificamente, prevê a conciliação, a mediação, o comitê de resolução de disputas e a arbitragem como métodos extrajudiciais de solução de controvérsias possíveis de serem adotados nos contratos que envolvem as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais.

Dentre eles, destaca-se a arbitragem, que se tornou prática recorrente em litígios cuja escolha estratégica se justifique pelo valor em disputa, especificidade da matéria, flexibilidade procedimental, tempo médio de duração e decisão que constitua título executivo judicial, ou seja, com a mesma validade da sentença judicial.

Instituída pela Lei nº 9.307/1996 e em 2015, a arbitragem é um processo privado pelo qual o direito das partes deve necessariamente se relacionar a questões patrimoniais disponíveis, portanto, a bens que podem ser alienados e que tenham valor econômico. Isso exclui, por exemplo, direitos que envolvam assuntos relacionados a crianças e adolescentes. Nela as partes podem convencionar se o caso será julgado pelo direito ou por equidade.

Os processos de arbitragem, em sua maioria, tanto os que envolvem apenas entes privados e nos que há a administração pública, são administrados por entidades privadas conhecidas como Centros de Soluções Extrajudiciais de Disputas, Centros de Arbitragem e Mediação ou mesmo Câmaras de Arbitragem. Essas organizações possuem regulamentos que disciplinam as regras procedimentais do processo, em observância à “norma matriz”, que é a lei federal de arbitragem.

Um ponto de destaque nesses regulamentos é a previsão de sigilo, como regra geral, advindo da consensualidade inerente à esfera privada. Essa prática, importante destacar, é adotada em diversas jurisdições e prevista nos regulamentos de Câmaras ao redor do mundo. Afinal, trata-se do âmbito privado.

No entanto, no que diz respeito à administração pública, um dos pilares do direito administrativo é o princípio da publicidade que incide em todos os atos da administração pública direta, o que inclui a publicização de licitações, contratos, convênios, concursos, processos etc. Esse princípio visa assegurar o acesso – transparente – às informações sobre a gestão pública de forma a permitir a participação cidadã e o controle social. Por essa razão, na arbitragem que envolva entes públicos é imperativa a transparência na divulgação das informações por força da lei (art. 2º, § 3°da Lei de Arbitragem).

Outro elemento relevante é que o processo de arbitragem é julgado por árbitros indicados pelas partes, cujo critério legal para escolha é que sejam quaisquer pessoas capazes e que tenham a confiança das partes. Nesse sentido, é prática comum no mercado que os árbitros sejam especialistas na matéria discutida em juízo, o que, por si só, diferencia a arbitragem da via judicial, uma vez que os juízes de direito lidam com um volume considerável de processos e analisam discussões de diversas naturezas. Na arbitragem, desde que respeitado o critério legal, podem ser nomeados, como árbitros, juristas, engenheiros, contadores, agrônomos etc.

Uma vez previsto em lei que a arbitragem que envolva a administração pública será sempre de direito e respeitará o princípio da publicidade, resta o vácuo normativo de como efetivar a publicidade. Portanto, como dar transparência e levar ao conhecimento público os atos da administração pública? Diante desse apontamento, disciplinar os atos de transparência cabe às partes e, na opção de não o fazerem, os regulamentos dos Centros de Arbitragem precisam conter a regra.

No contexto brasileiro não há unanimidade em relação a quais informações devem ser divulgadas. Em alguns casos, as próprias partes definem contratualmente os limites e a forma de divulgação das informações, inclusive como se promoverá o acesso às audiências.

Quanto aos regulamentos das Câmaras não há um padrão estabelecido, exceto em relação à divulgação das informações no website da instituição. Alguns preveem transparência na divulgação do número do processo, outros utilizam números fictícios. Outros informam os nomes dos árbitros indicados, a nacionalidade do profissional, a parte responsável pela indicação, a posição assumida (se árbitro único, coárbitro ou arbitro presidente) e a data da constituição do tribunal arbitral, ao passo que alguns não mencionam a composição dos tribunais arbitrais. Ainda há aqueles que especificam a qual tipo de processo se refere aquela arbitragem, se principal ou de emergência para apreciação de medidas de urgência.

Apesar de o Brasil não ser signatário de tratados e convenções que permitem as arbitragens de investimento no território nacional, o cenário internacional permite traçar um paralelo.

Nessas arbitragens o nível de detalhamento das informações é maior. Para além de informações procedimentais como nomes das partes, árbitros e advogados, sede, setor econômico, matéria, idioma, Tratado ou Convenção aplicável, participação em audiências, peças processuais etc., a regra geral é de divulgação das decisões tomadas pelos árbitros, tanto interlocutórias como finais.

O parâmetro da transparência é elevado a ponto de a ONU possuir norma específica sobre o tema: a Convenção das Nações Unidas sobre Transparência na Arbitragem entre Investidores e Estados Baseada em Tratados (Nova York, 2014) (a “Convenção das Maurícias sobre Transparência”), cuja entrada em vigor se deu em 2017. A União Europeia assinou a Convenção no ano 2024, oportunizando, portanto, que seus Estados-membros ratifiquem, adiram ou aprovem o texto.

Diante desse contexto, apesar de não haver consenso quanto ao detalhamento das informações divulgadas a nível nacional, a transparência que se dá é latente.

Contudo, é importante que haja o aprimoramento do sistema, principalmente porque o mercado das arbitragens institucionais é autorregulado. Um estruturado projeto de governança entre câmaras pode vir a fortalecer o instituto não apenas em termos de eficiência, mas em relação à segurança jurídica que o Estado Democrático de Direito deve proporcionar.

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Esta série é uma parceria entre o Blog do Fausto Macedo e o Instituto Não Aceito Corrupção. Os artigos têm publicação periódica

 

 
 
 

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