Não nos enganemos. O Brasil não é corrupto. O Estado não é corrupto. Empresas não são corruptas
Luiz Eduardo de Almeida 31/10/2023 às 13:05
*Integridade e Desenvolvimento é uma coluna do Centro de Estudos em Integridade e Desenvolvimento (CEID), do Instituto Não Aceito Corrupção (INAC). Os artigos têm publicação semanal.
Não nos enganemos. O Brasil não é corrupto. O Estado não é corrupto. Empresas não são corruptas. Instituições não são corruptas. Partidos políticos não são corruptos. Setores econômicos não são corruptos.
Nunca é demais lembrar que são pessoas físicas que decidem praticar determinados atos de corrupção satisfazendo seus interesses egoísticos. Logo, são pessoas que ocupam cargos ou funções em empresas, nos governos, entre outros, que decidem deturpar as funções legítimas destes entes e os contaminam. Utilizam cargos, empresas, instituições e o próprio Estado como instrumentos para a prática dos seus atos de corrupção.
Assim, uma das primeiras medidas saudáveis a ser adotada é intensificar a observação das pessoas que ocupam cargos decisórios, aumentando a transparência das decisões e dos processos decisórios. Assim, o foco está nas pessoas e decisões e não na generalização do Estado, empresas ou instituições.
A generalização de tais atos por pessoas ligadas a determinados grupos, setores econômicos, empresas, entre outros, gera uma série de consequências indesejadas, entre as quais se destacam a naturalização e a tolerância da corrupção. Cria-se ambiente e percepção de que determinados negócios dependem da prática de atos de corrupção.
Não é raro ouvir relatos sobre cálculos de investimento ou negócios que consideram "taxas ou custos de viabilização", "fee" em razão de "auxílios" ou "facilitações", entre outros termos utilizados para se referir a valores destinados a pagamento de atos de desvio. Inclusive, não é incomum que seja taxado de ingênuo ou amador quem não considera tais fatores em planejamentos. Afinal, quem realiza tais críticas costuma afirmar que "é assim que se faz negócio no Brasil".
Esse ambiente obriga questionar: O quanto o ambiente de negócios e o relacionamento público-privado é realmente dependente de práticas corruptas? O quanto o tom dos atos dos ocupantes dos altos cargos públicos e privados contribui para a construção dessa cultura?
Agravam o contexto dos questionamentos as repetidas tentativas de naturalização de práticas de atos de corrupção através da condenação seletiva de pessoas e não de condutas, do menosprezo e ridicularização àqueles que buscam agir e difundir integridade nos negócios e na política ou da reprovação de ações de investigação de atos de corrupção.
Esse movimento alimenta a cultura de impunidade, que voltou a ganhar força com o fim da Operação Lava Jato durante o governo Bolsonaro, absolvições e prescrições em casos de corrupção e se intensifica com a recente decisão de anulação das provas da delação da Odebrecht.
Também não se pode desconsiderar a mensagem e disseminação de cultura que os casos dos presentes envolvendo ocupantes do cargo máximo do Executivo Federal transmitem a todos.
Um Presidente da República agindo como representante do Brasil recebe presentes como chefe de Estado. Não é presente pessoal. Caso se entenda que tais presentes são pessoais, uma contradição ainda pior se apresenta.
Como se poderia reprovar apenas os atos praticados pelo Presidente Lula ou apenas os atos praticados pelo ex-Presidente Bolsonaro? Nesse caso é evidente a ausência de compromisso com a integridade. Se trataria da defesa irracional e irrestrita de um partido ou de um político.
Agrava esse cenário a afirmação do Presidente Lula de que "a sociedade não tem que saber como vota um Ministro do Supremo Tribunal Federal", defendendo a divulgação apenas do placar de votos ao final do julgamento sem a indicação dos nomes dos Ministros que votaram.
Sigilo de decisões não é compatível com a democracia, com a integridade ou com qualquer comportamento republicano esperado. E mais: não colabora para o fortalecimento da tão necessária cultura de integridade.
Do mesmo modo, insistentes disputas e pedidos de restituição de notórios presentes dados em função de cargo de Presidente da República -- pedidos realizados pelo presidente Lula e pelo ex-presidente Bolsonaro -- também não são condutas compatíveis com o regime democrático, com a integridade ou comportamento republicano esperado de alto cargo.
É necessário refletir sobre o compromisso individual com a integridade e buscar colaborar para o processo de independência da corrupção no Brasil. Não precisamos lembrar que, do lado empresarial, em termos práticos, corrupção significa retrocesso no ambiente de negócios, menos investimentos, maiores custos e graves impactos econômicos.
Do lado da sociedade, significa menos segurança, liberdade, saúde, educação, e todas as demais prestações devidas pelo Estado. Se a história ou as lendas podem nos ensinar algo que seja para ajustarmos nosso grito em cada decisão individual para "integridade ou morte".
A dependência da corrupção não levará ao desenvolvimento da sociedade e do Brasil.
*Integridade e Desenvolvimento é uma coluna do Centro de Estudos em Integridade e Desenvolvimento (CEID), do Instituto Não Aceito Corrupção (INAC). Os artigos têm publicação semanal.
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