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  • tayane16

Prefeitos precisam trabalhar sem medo


A corrupção é um flagelo que atinge a sociedade, vem de tempos imemoriais, e seguramente não vai acabar. O que se pode e deve fazer é intensificar os esforços para que os que lutam contra esse mal estejam alertas e preparados para vencerem as batalhas.


Este início de mandato dos prefeitos em período de pandemia é o momento propício para chamar a atenção de todos. Necessidades de gastos públicos urgentes e necessários levaram a alterações recentes, emergenciais e muitas vezes temporárias da legislação, dada a imprescindível flexibilização das normas e sistemas de controle. Criou-se um cenário propício para a propagação desse verdadeiro “vírus” que atinge o comportamento das pessoas. É preciso estar atento e agir para que a corrupção não se transforme em outra “pandemia”.


O combate à corrupção se fortaleceu no Brasil nos últimos anos, principalmente a partir do episódio do “mensalão”, em meados da década de 2000, com a revelação de falcatruas atingindo os altos escalões governamentais à época. Fenômenos como a operação “lava-jato”, que resultaram em condenações pelas mais altas cortes de Justiça do país levaram ricos e poderosos à prisão, e mudaram o paradigma da impunidade então vigente.


Mesmo assim, o que se constata é que isto não pôs um fim à prática nociva, que continuou presente, como se pode verificar de notícias que chegam o tempo todo de diversos lugares, mostrando a necessidade de manter atenção e vigilância permanentes. Uma enfermidade social que não tem partido, ideologia, limites territoriais ou temporais, nem preferência de qualquer natureza. O que muda é apenas sua intensidade.


A indignação que desde então tomou conta de todos levou a um endurecimento das normas direta ou indiretamente voltadas à fiscalização, apuração e punição dessas condutas ilícitas, bem como ao fortalecimento das várias instituições com atribuições na área. Foi o caso do Poder Judiciário, Ministério Público, Tribunais de Contas, Controladorias, das diversas polícias e da sociedade em geral, por meio do controle exercido por todos os cidadãos, pela imprensa e organizações da sociedade civil, entre outros.


Mas, como se sabe, a diferença entre o veneno e o remédio está na dose, e a reação a esse novo cenário apareceu, muitas vezes evidenciando exageros e injustiças.


Com muitos inocentes atingidos, empresas e pessoas injustamente envolvidas e até punidas, surgiram as primeiras formas de atenuar seus efeitos, pela facilitação de solução dos problemas, como foi o caso dos acordos de leniência e outras formas de ajustes de conduta.


Vê-se que ainda estamos em busca de um modelo ideal de combate à corrupção, que seja eficiente e duro o bastante para desincentivar a prática dessas condutas, sem que inviabilize ou aterrorize o gestor público que tem boas intenções e retidão de caráter e conduta.


O chamado “apagão das canetas”, expressão que explicita a situação vivida por muitos, que optam por nada fazer e paralisar a máquina pública, exatamente para evitar o risco de cometer falhas e sofrer punições, em nada colabora para o desenvolvimento econômico e social do país. Na verdade, prejudica, e muito! Recursos públicos disponíveis e obras paradas, tempo perdido, economia estagnada, desemprego, políticas públicas que não saem do papel, são alguns dos muitos exemplos causados por um poder público que não consegue seguir adiante.


Esse é o momento oportuno para uma mensagem de alento e incentivo aos novos prefeitos, eleitos ou reeleitos, que acabaram de tomar posse e tem todo o mandato pela frente. O tempo é curto para realizar tudo o que é preciso, e não se pode desperdiçá-lo obstruído pelo temor de errar.


Um tempo curto para fazer o que é preciso, não havendo tempo para perder. Trabalhar com honestidade, rapidez e eficiência são as regras para uma boa gestão, sem sobressaltos nem preocupação em responder a processos por décadas, sem que tenha tido qualquer intenção de fazer mau uso do dinheiro público.


Hoje são muitas as esferas de responsabilização e órgãos com atribuições para identificar e punir malversação de recursos públicos.


Há responsabilização pessoal do gestor em diversas esferas institucionais e por uma multiplicidade de órgãos. Na esfera penal existem os crimes contra a administração pública, que envolvem as polícias na investigação, o Ministério Público e o Poder Judiciário na instrução e punição. Na esfera civil e administrativa existem os atos que caracterizam improbidade administrativa, as ações civis públicas e outros instrumentos e regimes jurídicos que podem levar a sanções aplicadas pelo sistema de Justiça. Os tribunais de contas certamente estão entre os mais presentes no controle dos atos do gestor público, e têm poderes importantes na apuração e punição de infrações de natureza financeira e administrativa. E não se pode esquecer dos crimes de responsabilidade, que fundamentam os cada vez mais comuns pedidos de impeachment, e já afastaram recentemente uma presidente da república, sendo muitos os prefeitos que perderam o mandato por essa mesma razão.


A legislação em matéria de gestão pública é ampla, complexa, e a interpretação não está consolidada. Há uma pluralidade de órgãos envolvidos, e não se pode esquecer que estamos em uma federação, em que as normas coexistem nos diversos entes e esferas de governo, sem muita clareza quanto à competência de cada um e os limites de suas atribuições nos aspectos funcionais e territoriais.


Não é incomum divergências de entendimento entre os órgãos envolvidos, superposição de investigações, e o gestor fica vulnerável, inseguro e sem saber como agir. Isso não é justo com quem tem honestidade de propósitos e preza pelo bom uso do dinheiro público.

É preciso agir, e rápido, para dar segurança jurídica ao gestor público, permitindo que possa trabalhar sem medo.


Os responsáveis pela apuração e punição devem ter sempre em mente a complexidade da situação, e fazer do ordenamento jurídico um aliado no combate à corrupção, para que seja possível separar o joio do trigo, e concentrar suas energias em perseguir apenas os verdadeiros malfeitores, trazendo paz e segurança aos que querem trabalhar pelo seu povo.


Os prefeitos podem ajudar a si próprios e seus colaboradores. Órgãos de controle interno bem estruturados e servidores interessados, motivados e capacitados são sempre valiosos instrumentos, sendo bem-vindos para se juntar à boa vontade de fazer sempre o melhor.

Mãos à obra, o país tem pressa!


*José Mauricio Conti, professor de Direito Financeiro da USP. Doutor e livre-docente em Direito Financeiro pela USP.

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