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Votar e afiançar

Não entrega de faixa presidencial pelo presidente que encerrou seu mandato.


Subida da rampa do Presidente eleito ao lado de representantes do povo brasileiro em toda a sua heterogeneidade.


Discurso de vários ministros empossados, dentre eles, Silvio Almeida, Ministro de Direitos Humanos, reforçando, como ele próprio destacou, o óbvio: PESSOAS EXISTEM e são VALIOSAS para nós.


Atos terroristas que vilipendiaram o patrimônio público, as instituições e a maioria absoluta dos brasileiros.


Não falo apenas dos eleitores que formaram maioria e escolheram Lula. Falo de todos os brasileiros e brasileiras com "B" maiúsculo. Que prezam pelo Brasil. Pela democracia. Pelo fato de sermos uma país pacífico e solidário. Sim. Maioria absoluta de todos nós.


Independente do posicionamento político, todas e todos nós condenamos veementemente a violência, a barbárie, o golpe e o terrorismo.


Mas isso, estamos escutando e repetindo à exaustão desde 8 de janeiro.


O que proponho aqui são algumas outras reflexões.


A primeira é sobre a diferença entre votar e afiançar.


Votar pressupõe um ato de confiança. Confiança de que a pessoa escolhida conseguirá, durante o seu mandato, executar, da melhor maneira aos olhos de cada eleitor, os planos que propõe para o Brasil, seus Estados e Municípios, tanto na esfera do Executivo quanto na do Legislativo.


O exercício do direito-dever de votar pressupõe, ainda, além da escolha, a obrigação de acompanhar e fiscalizar com visão crítica.


Ao final do mandato, cabe ao eleitor verificar se os eleitos atenderam integral ou parcialmente suas expectativas ou não as atenderam satisfatoriamente. Depois deste balanço o que resta é, novamente, exercer o seu direito-dever de votar, repetindo as escolhas anteriormente feitas ou buscando outras pessoas para ocupar os cargos.


Afiançar, por outro lado, significa assegurar ou abonar alguém, haja o que houver. Uma espécie de responsabilidade compartilhada. O famoso "estou contigo e não abro!"


A reflexão que proponho é: afiançamos alguém de nossa família irrestritamente? Afiançamos algum colega de trabalho de forma absoluta? Afiançamos algum amigo ou amiga também de forma irrestrita?


Se as respostas forem um sonoro "Eu não ponho minha mão no fogo por ninguém!", a pergunta que se segue é: Por que fazer isso por um político?


O que se precisa entender é porque existe este sentimento arrebatador que leva pessoas inteligentes a agirem de forma apaixonada, afiançando alguém que sequer conhecem.


Não defendemos sequer nossos pais ou filhos de forma incondicional quando agem mal, então por que fazê-lo com qualquer que seja o político?


O que a maior parte dos eleitores brasileiros disse, sim, "disse nas urnas" - e essa é uma das formas democráticas de liberdade de expressão - é que embora tenha sido eleito em 2018, o antigo presidente não cumpriu as expectativas da maioria dos eleitores que a ele confiaram a administração do país e, portanto, não foi escolhido para um segundo mandato.


E assim acontecerá com o atual Presidente se, no balanço, no final de 2026, não honrar integral ou parcialmente a confiança nele depositada.


Em uma democracia madura em que a análise racional é necessária, o dever de observar, fiscalizar e cobrar resultados dos eleitos recai muito mais sobre a situação do que sobre a oposição pois, afinal, a confiança foi externada nas urnas e o trabalho a ser desenvolvido tem que ser colocado em prática.


Esta ideia foi muito bem colocada em um vídeo sobre Democracia, publicado, em 2020, pelo Prof. Fabiano Del Masso, intitulado Espírito democrático em discussão.


Outra reflexão válida que decorre deste distanciamento que permite a observação é sobre o pano de fundo de todos estes movimentos e decepções vivenciados pelos defensores mais ferrenhos do ex-presidente derrotado nas últimas eleições.


O inconformismo com um possível insucesso nas urnas já era por muitos externado mesmo durante o mandato, sobretudo pela derrota, para alguns inesperada, de Donald Trump nas eleições americanas.


Após o 2º turno, esperavam o apoio do Líder que não veio, revestido da desculpa que ele precisava ser preservado. Pergunta-se: qual líder da história mundial pensou em se preservar?


Criticam a lisura da urna eletrônica, a mesma que elegeu Bolsonaro em 2018. Pergunta-se: o processo foi fraudulento apenas no que tange ao Presidente eleito? Governadores, senadores e deputados que apoiavam o ex-presidente e que venceram as eleições para o Parlamento ou Estados consequentemente também venceram fraudulentamente?


Os ricos, financiadores, empresários e políticos supostamente envolvidos não estavam presentes durante os atos depredatórios que ocorreram na capital federal. Por quê? Porque tinham que se preservar, pois só assim daria certo... Mesmo?


A desigualdade, que, no Brasil, é definitivamente estrutural, serve como um verdadeiro protocolo para a manipulação.


Estimula-se, entusiasma-se, financia-se, envia-se para a batalha pessoas que pensam que participam de "uma grande revolução", enquanto os "revolucionários" ricos ficam em seus iPhones, no conforto de seus lares ou empresas, insuflando e instigando a tal "tomada de poder" nas redes sociais.


Mas vamos a mais algumas reflexões.


Por que brasileiros defensores da chamada "tradicional família brasileira" e da "ordem" atentaram contra os Três poderes da República? Dirão: Não foram os defensores do antigo governante, mas os "infiltrados".


Por que a segurança do governo do Distrito Federal não agiu para impedir? Dirão: O Governo Federal é que se omitiu, pois desejava este quebra-quebra para "manchar" o movimento "legítimo" de "tomada do poder".


O que esperavam, nesse caso, aqueles que estavam acampados diante dos quartéis e que foram escoltados até a Praça dos Três Poderes? Uma "tomada de poder" pacífica, em que se pediria licença para os policiais para entrar nos prédios para ali ficarem?


Lá permaneceriam, mantidos por generosos doadores de alimentação, até que as Forças Armadas organizassem um novo "comando", esperando o retorno glorioso do ex-presidente não reeleito para assumir a sua liderança?


Pressupor este cenário é, no mínimo, imaginar o inimaginável. O resultado pretendido, assim sendo, merece ser pontuado para poder ser bem compreendido:


Primeiro, as instituições democráticas constituídas se renderiam à entrada pacífica dos que pediam a intervenção militar.


Depois, a população que elegeu Lula também se calaria, aceitando a entrada pacífica dos "manifestantes do bem", nas sedes dos Três Poderes.


Por fim, o Supremo seria fechado, o Congresso também, e um governo nacionalista e democrático comandaria todos e todas nós.


Seria isso? Não parece crível que um desfecho assim pudesse ocorrer.


Imperioso reconhecer que esse ataque aos poderes constituídos permitiu que houvesse uma demonstração pública de união, força e solidez das instituições democráticas do país, como a que ocorreu no dia 9 de janeiro, com os chefes dos três poderes da Nação e Governadores dos 26 Estados e DF, de partidos de situação e oposição, descendo a rampa do Planalto de braços dados.


Resultado: Atos terroristas controlados, instituições democráticas demonstrando sua união e força, e o Brasil, que no slogan conhecido está "acima de todos", embora sangrando com tamanho desrespeito e agressão, segue confiante em seu futuro promissor que, esperamos, desta vez chegue, com justiça social e diminuição da desigualdade.


*Ana Cláudia Scalquette, advogada. Doutora em Direito Civil pela USP. Escritora. Professora universitária. Conselheira estadual da OABSP


Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção


Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Os artigos têm publicação periódica

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