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A transparência pública é importante para a democracia

Por Murilo Borsio Bataglia*

16/01/2023 | 05h00


Governo do povo e para o povo. Essa é uma tradicional definição de democracia que perpassa gerações. Definir esse regime político é uma responsabilidade pois se leva em consideração diferentes contextos e modelos. Estudiosos procuram conceituá-la, com enfoques em alguns aspectos: democracia de massa, direta, representativa ou indireta, participativa, deliberativa. Em todas elas, um elemento comum é buscar uma forma de como o povo poderia atuar na tomada de decisões públicas.


Este artigo tem o objetivo de, a partir do debate democrático, encontrar raízes para valorização da transparência pública e apontar os desafios desse campo que podem se tornar agenda governamental no governo federal. Questiona-se: o que se espera de ações voltadas para a transparência no novo governo? Para buscar respostas, retomam-se compromissos que o Brasil assumiu internacionalmente e internamente, legislações, relatórios e narrativas que têm sido proferidas na passagem de cargos.


Bobbio, ao discorrer sobre uma das posturas que a democracia deveria assumir, indicou a eliminação do "poder invisível", como uma forma de descrever o enfrentamento do sigilo, dos serviços ou atos "secretos", máfia. Enfatizou a promessa da transparência como um elemento que contribui para esse regime acontecer. A democracia teria nascido com o objetivo de eliminar o poder invisível e concretizar um governo que tornasse públicas suas ações, possibilitando o controle social e a distinção do que é lícito do que não é. (BOBBIO, 1997).


Adentrando nos compromissos internacionais, o Brasil assumiu a tarefa de enfrentar a corrupção, aperfeiçoar a gestão pública e efetivar direitos. E para realizar essas tarefas, passa-se pelo debate da transparência. Nesse cenário, a OCDE elaborou um relatório (jun/2022) avaliando e recomendando ações para o Brasil se enquadrar na organização. São ações que foram reconhecidas: política de dados abertos, atuação constante da CGU, Portal da Transparência; e são ações necessárias: criar estratégia nacional de governo aberto, fortalecer a participação da sociedade nesses processos, reverter o "ambiente restrito" para livre exercício de direitos. (TRANSPARÊNCIA BRASIL, 2022). Ainda no cenário internacional, na Parceria para o Governo Aberto da qual o Brasil faz parte, há planos a serem cumpridos. O Brasil apresentou o 5º plano de ação (e está prestes a elaborar o 6º), e enumerou compromissos como: disponibilização de bases de dados ambientais; criação de laboratório com entendimentos e produção científica sobre corrupção (criado recentemente pela CGU); criação de banco de dados sobre violação de direitos humanos; disponibilização de informações sobre imóveis públicos federais; padronização de sistemas de vigilância sanitária; controle social da dívida ativa, (BRASIL, 2021).


Quanto aos compromissos assumidos em campanha pelo governo eleito, enumeram-se a transparência na definição de orçamentos públicos, na ação policial, no enfrentamento da corrupção e promoção da integridade pública, implementação da Lei de Acesso à Informação, e no processo decisório de modo geral. (TSE, 2022). Tais compromissos se aproximam do que foi exposto no relatório do gabinete de transição, que também destacou o papel da articulação de instituições como CGU, AGU, CEP/PR, COAF, PGFN, TCU e MPU; e de iniciativas e normas como: "i) o Portal da Transparência; ii) a Lei de Acesso à Informação; iii) o plano de Dados Abertos do governo federal; iv) a Lei de Conflito de Interesses; v) a Lei Anticorrupção etc., que juntos aprimoraram a execução e o controle dos recursos públicos no país." (GABINETE DE TRANSIÇÃO, 2022).


Assim, percebe-se que é necessário reverter a onda de decretos de sigilos, de orçamentos secretos, de usos indiscriminados da justificativa de "dados pessoais" para negar pedidos de acesso à informação, de ameaças à transparência pública.


Espera-se uma agenda que reflita: em que medida utilizar tecnologias e inteligência artificial para garantir transparência pública? Qual linguagem utilizar para comunicar a informação pública? Como disponibilizar e utilizar dados abertos para aproveitamento da própria sociedade? Como garantir a qualidade desses dados? Quais canais e portais podem ser estratégicos para possibilitar a transparência e a participação em um governo aberto? Qual a previsão de incluir a perspectiva de raça e gênero nessa mesma transparência, acesso à informação e participação?


Reportando ao discurso do novo Ministro da CGU, que teve de reafirmar o óbvio: "a transparência é a regra, o sigilo é a exceção". E parafraseando o discurso inclusivo do novo Ministro de Direitos Humanos, dizemos que a transparência pública é importante para nós, é importante para a democracia.


REFERÊNCIAS

AFFONSO, Julia. Novo ministro da CGu assume cargo, prega transparência e diz que sigilo é exceção. O Estado de São Paulo. 03. Jan. 2023. Disponível em:


BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.



BRASIL. CGU. Planos de ação para governo aberto. Disponível em: https://www.gov.br/cgu/pt-br/governo-aberto/a-ogp/planos-de-acao


FARRANHA, Ana Claudia. O que eu desejo para as novas legislaturas? Muita transparência!. Estadão. Dez. 2022. Disponível em: https://www.estadao.com.br/politica/legis-ativo/feliz-2023-o-que-eu-desejo-para-as-novas-legislaturas-muita-transparencia/


GABINETE DE TRANSIÇÃO. Relatório final do gabinete de transição governamental. 2022. Disponível em: https://gabinetedatransicao.com.br/noticias/relatorio-final-do-gabinete-de-transicao-governamental/.


TEIXEIRA, Ana Claudia; ALMEIDA, Carla; MORONI, José Antonio (orgs). A democracia necessária e desejada. São Paulo: Lutas anticapital, 2020.



TREVISAN, Maria Carolina. Novo governo deve investir em transparência e participação social, diz OCDE. A Folha de São Paulo. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/folha-social-mais/2022/10/novo-governo-deve-investir-em-transparencia-e-participacao-social-diz-ocde.shtml


TSE. Diretrizes para o programa de reconstrução e transformação do Brasil. 2022. Disponível em: https://divulgacandcontas.tse.jus.br/candidaturas/oficial/2022/BR/BR/544/candidatos/280001607829/pje-3b1196fd-Proposta%20de%20governo.pdf


*Murilo Borsio Bataglia, professor da Universidade de Brasília (UnB). Doutorando e Mestre em Direito pela UnB (PPGD/UnB)


Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção


Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Os artigos têm publicação periódica

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