A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é uma das mais importantes organizações internacionais. Criada após a Segunda Grande Guerra, é usualmente conhecida como o “Clube dos Países Ricos”, já que agrega as maiores economias mundiais. Desde os idos dos anos 90, o Brasil demonstra interesse em participar como país membro. Para atingir esse objetivo, o País vem integrando comitês e grupos de trabalho e até aderiu e ratificou relevantes instrumentos jurídicos, como a Convenção sobre Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais (Convenção Antissuborno), mesmo não sendo um país membro da OCDE. Tudo isto para demonstrar o interesse em fazer parte da organização. Diante desse quadro duas questões decorrem. Primeira: o que o Brasil precisa fazer para se tornar um dos países membros da OCDE e, dessa forma, melhorar sua resposta ao combate à corrupção? Segunda: até quando o Brasil continuará ignorando a dissipação dos recursos públicos, o aumento das desigualdades socioeconômicas e dos estragos ambientais e a diminuição da confiança nas instituições democráticas resultantes da corrupção sistêmica que devasta o país?
A acessão/adesão de um país à OCDE é longa e minuciosa. Em 29 de maio de 2017, se concretizaram as tratativas brasileiras para o ingresso naquela organização, durante a presidência do governo do Presidente Michel Temer, com a formalização do pedido de abertura do processo de acessão do País. Em 25 de janeiro de 2022, o Brasil recebeu a carta-convite da OCDE, oficializando o início do processo de acessão. Mas, há menos de um mês atrás, em 10 de junho último unicamente, é que o Conselho de Ministros da OCDE reconheceu oficialmente o plano proposto para o processo de acessão do Brasil, adotando formalmente o accession roadmap (mapa de acessão), que é o documento indicativo das etapas a cumprir pelo Brasil para o processo de adesão. É quase desnecessário dizer que esse processo leva em conta fatores políticos, mas tem seus pilares, fundamentalmente, no conteúdo técnico apresentado pelo país durante o processo de acessão, o qual é avaliado pelos comitês especializados e pelo Secretariado da OCDE, antes da aprovação da adesão do país pelos membros do Conselho da OCDE. A partir do reconhecimento formal do mapa de acessão, o processo todo leva ainda de três a cinco anos, podendo até levar mais tempo do que isso e igualmente podendo ser interrompido a qualquer momento, diante de mudanças das circunstâncias.
A Convenção Antissuborno da OCDE foi concluída em 1997, em Paris. O combate ao suborno internacional dos funcionários públicos serviu de cenário para sua concepção. A corrupção nos negócios internacionais causa danos ao desenvolvimento socioeconômico e ambiental e às instituições democráticas. Os trinta e oito países membros da OCDE são signatários da Convenção Antissuborno, ao lado de seis países não membros: Argentina, Brasil, Bulgária, Peru, Rússia e África do Sul. A Convenção da OCDE traz, portanto, uma base sólida para reduzir o impacto da corrupção e do suborno nas transações internacionais, embora sua implementação uniforme e eficaz pelos países que a aderiram ainda seja um desafio, inclusive para o Brasil.
Desde a ratificação da Convenção Antissuborno em 15 de junho de 2000, o Brasil tem realizado vários esforços no aprimoramento da legislação interna e no fortalecimento das instituições de controle, que culminaram na promulgação da Lei Anticorrupção brasileira em 2013. Os resultados positivos na luta contra a corrupção não tardam a aparecer, como o início da operação Lava Jato, a descoberta do escândalo de corrupção da Odebrecht – que impactou praticamente toda a América Latina – e de outras grandes empresas brasileiras do setor da engenharia e construção.
Hoje, a situação é diversa. O Brasil, mundialmente conhecido por enfrentar a corrupção transnacional e punir os corruptos, ficou acuado e recuou. O Índice de Percepção da Corrupção (IPC 2021) da Transparência Internacional mostra que dentre os cento e oitenta países examinados, o Brasil caiu duas posições em comparação ao ano passado (96º lugar), embora a nota do País tenha sido mantida em relação ao IPC2020 (38 pontos numa escala de 100 pontos)[1]. O desempenho brasileiro em relação ao combate à corrupção medido pelo IPC2021 está abaixo da média global (43 pontos), aquém da média dos países membros da OCDE (66 pontos) e inferior à média da América Latina (41 pontos). Mesmo o recente Índice de Capacidade de Combate à Corrupção (CCC 2022), publicado pela American Society Council of the Americas[2], classifica o Brasil em décimo lugar dos quinze países analisados, classificado a frente apenas do Paraguai, do México, da Guatemala, da Bolívia e da Venezuela.
Dentre os pilares políticos, econômicos, sociais e ambientais das políticas públicas de boa governança pública promovidas pela OCDE, o combate à corrupção é a mola mestra. Países fortes só podem ser construídos sob uma pedra angular íntegra, transparente e ética. Promover o combate à corrupção e o suborno é necessário para que o Brasil realize seu sonho há tanto sonhado de fazer parte do “Clube do Países Ricos”. As mudanças necessárias no combate à corrupção e na promoção da integridade pública não são superficiais, nem ilusórias; elas serão profundas e sólidas, para que indiquem de fato um caminho sem volta na luta contra a corrupção. A acessão do Brasil à OCDE é a melhor resposta e, talvez a única, ao combate à corrupção, impactando, positivamente, o bem-estar socioeconômico e ambiental da sociedade como um todo e dos menos favorecidos, em particular.
Ligia Maura Costa, professora titular na FGV EAESP, coordenadora do FGVethics, advogada
Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção
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