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O eterno estado de emergência em que vivemos…


Vanessa Reis*

11 de novembro de 2022 | 05h00


Foi aprovada, nesta quarta-feira, dia 9/11/22, a Medida Provisória MP 1.130/2022, que libera um crédito extraordinário de R$ 27 bilhões ao Ministério da Cidadania, para o financiamento, até dezembro, do aumento de R$ 400 para R$ 600 no valor do Auxílio Brasil, pago a mais de 21 milhões de famílias. Até o final da semana se espera a entrega do texto da PEC Emergencial da Transição, que exclui do “teto de gastos” o auxílio brasil ou renomeado bolsa família, liberando cerca de R$105 bilhões já inscritos no projeto de Orçamento de 2023.


Para dar sustentabilidade ao controle da dívida brasileira possuímos atualmente duas âncoras fiscais básicas: a regra de ouro e o teto de gastos. A chamada “regra de ouro” veda a constituição de dívidas para cobrir despesas correntes e de custeio. Ou seja, o poder público não pode se endividar para pagar despesas do dia a dia, como despesas de pessoal. Essa regra constitucional foi afastada, momentaneamente, por emendas constitucionais, em razão da pandemia. Foi também instituído um novo gatilho de cortes de despesas, principalmente de pessoal, quando ultrapassados os limites propostos. Já o “teto de gastos” estabelece como meta, para o limite das despesas do Governo, o equivalente à despesa de 2016, acrescida da inflação ano a ano, sendo fixado pela Emenda Constitucional nº 95, promulgada em 15 de dezembro de 2016. Todas essas regras fiscais contribuem para manter a economia do país estável e a preservação da nossa reserva de liquidez, que é nosso colchão para pagamento da dívida pública. São parâmetros fundamentais para retomada do desenvolvimento econômico e credibilidade do país, como um importante player no cenário mundial, o que inclui a gestão da dívida pública, conforme inclusive lista de princípios fundamentais de adesão à OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) divulgada em junho de 2022.


É importante relembrar o cenário que o país vivia antes da edição da Lei de Responsabilidade Fiscal, Lei Complementar nº 101, quando o endividamento externo representava um risco ao país. A LRF era apontada como um divisor de águas no processo de melhoria da administração das finanças públicas, inaugurando um novo tipo de responsabilidade, a fiscal, lastreada no princípio da prudência e no conceito de accountability, que envolve o controle dos gastos públicos e a responsabilidade da gerência, para alcançar melhor desempenho, com rígidas exigências no âmbito da transparência. A sustentabilidade da dívida passou a ter cunho constitucional e as leis orçamentárias devem compreender as metas e as prioridades da administração pública federal, com as diretrizes de política fiscal em consonância com a trajetória sustentável da dívida pública.


A situação dos entes federativos com o endividamento público também não é favorável, com a promulgação da Constituição de 1988, ocorreu uma extensa repartição formal de receitas realizada para os Estados e Municípios. No entanto, em contrapartida, houve um enorme aumento das obrigações constitucionais dos entes, principalmente com saúde, educação e o aumento das despesas de pessoal e de inativos, aliada à diminuição das receitas tributárias da União, com a compulsória instituição de contribuições não sujeitas à repasse. O que ocorre, nos dias de hoje, são entes dependentes de transferências voluntárias do Governo Federal. Este, por sua vez, dita quais serão as políticas públicas a serem desenvolvidas. Assim, a única viabilidade de qualquer intenção de fortalecimento dos entes federativos deve passar por uma profunda reforma do pacto federativo, que dependerá também de uma reforma constitucional, ao lado de uma reforma fiscal e tributária, para a real definição de quais serão nossas novas balizas de controle.


No entanto, vivemos em um constante estado de emergência no campo das finanças públicas, como se não houvesse amanhã, atingindo não somente as gerações futuras, como a presente, diante das soluções imediatas para alguns problemas amplamente já conhecidos. A realidade é que, agora, não temos como escolher muito quais serão as despesas, que não sejam com ampliação de auxílios emergenciais. É praticamente um direito da atual geração ao incremento da despesa pública, mas deveríamos certa forma, não perder o rumo da importância da proporcionalidade na divisão dos encargos intergeracionais, numa relação de solidariedade na proporção sacrifício/benefícios das gerações vindouras, com a aplicação do princípio da proporcionalidade na repartição dos encargos.


O grande problema é que a utilização dos dinheiros públicos, por parte dos agentes públicos, sempre é impregnada de negatividade e suspeição e a melhor despesa é a que não existe, pois intuitivamente há o entendimento coletivo que se dirige às falhas, malversação e corrupção, levando a crer que gastar não seja encarado como um valor a ser protegido.


Porém, a despesa pública constitui a concretização de imposições constitucionais, a realização da consagração de direitos fundamentais e a materialização de determinados bens jurídicos constitucionalmente consagrados e não podemos parar, pois o Brasil é uma força que nos leva a cantar, uma força estranha no ar, e por isso que canto e não posso parar, afinal, o Brasil é terra boa e gostosa, terra de Nosso Senhor! (homenagem à querida Gal Costa – + 09.11.22)


*Vanessa Reis é sócia do Medina Osório Advogados, mestre em Direito da Administração Pública, doutoranda em Direito Financeiro e Econômico Global pela Universidade de Lisboa, professora de Direito Financeiro e procuradora do Estado


Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção


Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Acesse aqui todos os artigos, que têm publicação periódica

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