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Para garantir efetividade à regulamentação do lobby no Brasil é preciso ir além do razoável

Andréa Cristina Oliveira Gozetto 12 Julho 2023 | 5min de leitura

O PL 1202 que visa a regulamentar a atividade de lobby, iniciado em 2007 por Carlos Zarattini (PT-SP), após reformulação de Lafayette de Andrada (Republicanos-MG) foi aprovado em novembro de 2022 na Câmara dos Deputados.


Em seu formato original, o PL 1202/07 se qualificava como uma alternativa viável para o aprofundamento e maturidade do debate acerca da regulamentação do lobby. Apesar de alguns pontos sensíveis, o PL trouxe elementos importantes, como: (I) registro obrigatório dos lobistas, (II) igualdade de oportunidade, ou seja, a garantia de acesso isonômico dos grupos de interesse ao processo estatal de tomada de decisões; e (III) curso de formação específico como requisito obrigatório. Com boa receptividade, o projeto foi aprovado pela Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público e pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC), ambas da Câmara dos Deputados.


Em abril de 2012, o relator do projeto na CCJC, Dep. Cesar Colnago (PSDB-ES), ofereceu parecer positivo a sua aprovação e apresentou substitutivo ao projeto.


Já em 2015, foi designada uma nova relatora, a deputada federal Cristiane Brasil (PTB-RJ), que proferiu em maio de 2018 pela aprovação da Emenda Modificativa de Plenário nº 1 ao substitutivo, de autoria do deputado federal Leo de Brito (PT-AC), na forma de Subemenda Substitutiva Global de Plenário (SSG), com os objetivos de (I) clarificar que o recebimento de doações de campanhas eleitorais, nos termos regidos pela Lei nº 9.504/1997, não se constitui como improbidade; (II) salientar alguns princípios regentes, como "interesse público", "direito a petição" e "isonomia"; (III) descrever de forma mais acurada as atividades exercidas pelos agentes de relações institucionais e governamentais; e (IV) dar mais clareza ao texto. Nota-se que o termo "lobby" desaparece por completo, sendo substituído por "representação de interesses".


Após a aprovação na Câmara dos Deputados, o PL 1202/07 seguiu para o Senado Federal. No Senado Federal o projeto está tramitando sob o número 2914/21 e o Senador Izalci Lucas (PSDB/DF) foi designado relator pelo senador Omar Aziz (PSD-AM) o que preside a Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor.


Sem dúvida, o PL n° 2914/2022 é o melhor texto já apresentado pelo Poder Legislativo sobre o tema. Ele avança em alguns pontos importantes. Ressalto aqui, quatro deles.


Em primeiro lugar, define que é dever do Poder Público efetivar em transparência ativa o registro das audiências, contendo a data, a identificação de todos os participantes, a identificação dos representados e a descrição do assunto para fins de acesso público à informação.


Em segundo lugar, cria dois tipos de representantes de interesse, os profissionais e os não profissionais. Aos profissionais possibilita o credenciamento junto aos órgãos e entidades do Poder Público, mediante solicitação dos interessados.


Em terceiro lugar, de forma inédita, expande a abrangência da lei a ocupantes de cargos na Câmara dos Deputados, Senado Federal, Tribunal de Contas, Poder Judiciário e Ministério Público cujas funções tenham natureza executiva.


Em quarto lugar, veda a representação profissional de interesse privado por agente público nos 12 meses subsequentes que deixar de ocupar cargo, emprego ou função pública.


No entanto, mesmo sendo positivos, os dois primeiros pontos trazem preocupações.


A primeira delas diz respeito a forma como se definiu audiência. Segundo o PL audiência é a "interação presencial ou tele presencial realizada dentro ou fora do local de trabalho, com ou sem agendamento prévio, em território nacional ou estrangeiro em que haja representação de interesse e participação de agente público". Dessa forma, o projeto deixa à margem contatos informais, tanto orais quanto escritos, extremamente comuns com o advento de tecnologias de comunicação virtual móveis, como WhatsApp. Com isso, restringe de maneira injustificada a atividade de lobby aos contatos diretos.


Além disso, o projeto não deixa clara a necessidade de se credenciar representantes em caráter não-profissional, visto que o texto versa especificamente sobre o credenciamento de representantes profissionais. Se o objetivo do registro é aumentar a transparência do processo decisório e garantir mais acesso a todos os grupos, seria ideal expor todos os interesses em jogo.


Apesar do Senador Izalci Lucas ter declarado publicamente que acredita que o tema já foi suficientemente discutido na Câmara dos Deputados e que manterá a espinha dorsal do projeto no Senado, tomou a decisão acertada de convocar uma audiência pública. Assim, em 14/06/2021 a Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor aprovou um requerimento para debater a regulamentação das Relações Institucionais e Governamentais (RIG).


Esse é um sinal de que haverá espaço para debater os dois pontos sensíveis que apontei acima? Ou a audiência pública do Senado será parecida com a que ocorreu na Câmara dos Deputados em 2022, para a qual não foram sequer convidadas, em primeiro momento, organizações da sociedade civil e especialistas no tema?


Afinal, o processo democrático traz em si a necessidade de ouvir o maior numero possível de interesses relevantes e legítimos sobre o tema em deliberação.


Por fim, é sempre bom lembrar ao legislador que a regulamentação do lobby tem como objetivo fomentar a publicidade de informações sobre lobistas, decisores e as interações que mantêm, assim como garantir maior transparência para a atividade ao: (i) catalogar e estipular um órgão para administrar os registros, (ii) estabelecer padrões de interação entre lobistas e agentes públicos e (ii) facilitar o escrutínio e a participação social, fomentando isonomia entre os grupos de interesse.


*Andréa Cristina Oliveira Gozetto é cientista política, doutora pela Unicamp. Coordenadora do MBA em Relações Governamentais e do curso de curta duração "Advocacy e Políticas Públicas" da FGV/IDE. Coordenadora do GT Transparência e Integridade da Rede Advocacy Colaborativo (RAC). Diretora executiva da Gozetto & Associados Consultoria Estratégica


Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção


Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Os artigos têm publicação periódica

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