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Reflexões essenciais para o exercício do controle na administração pública brasileira: cautela, sens

Por Plínio dos Santos Souza e Josiel Lopes Valadares*

05/06/2023 | 09h00


A Administração Pública Brasileira ao longo de sua história tem apresentado movimentos pendulares, alternando entre momentos de exacerbação de práticas específicas e a produção de legislações sobre determinados tópicos, e outros momentos em que falta um enfoque ou preocupação temática clara. Esse movimento pendular é particularmente observável quando se trata do controle externo e interno exercido sobre as instituições e agentes públicos. Um breve percurso histórico das legislações relacionadas a essa temática fortalece a argumentação em favor da existência desse movimento pendular.


Ao iniciar este trajeto, devem ser destacadas dois importantes dispositivos: Constituição Federal (1988) e Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92). A primeira se trata de um marco imprescindível para a temática seja através dos dispositivos relacionados aos controles internos e externos, seja através da explicitação dos princípios da Administração Pública, seja por meio da legitimidade instituída a qualquer cidadão de proposição de ação popular ou de denúncia de irregularidades ou de ilegalidades aos órgãos de controle competentes. A segunda enquanto baliza relacionada à probidade na organização do Estado. Nos anos 2000, se destaca a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei 101/2000) concluindo assim um primeiro ciclo de importantes legislações relacionadas ao tema. A partir da primeira década do século XXI, se inicia, portanto, um segundo e mais intenso ciclo publicação de legislações tais como: Lei da Transparência, Lei de Acesso à Informação, Lei Anticorrupção, Lei da Ficha Limpa, Lei de Conflito de Interesses denotando em um período de cinco anos esta série de leis.


Esse movimento pendular relacionado ao controle e responsabilização na Administração Pública brasileira pode ser atribuído a várias razões, como o processo de profissionalização da burocracia pública, o maior acesso à informação pela sociedade e a exposição de escândalos trazidos à tona pelos diversos meios de comunicação do país. Esses fatores despertam o interesse da população e estimulam a responsabilização social, o que é benéfico para o exercício democrático. No campo da Gestão Pública, tal contexto se mostra um lócus impulsionador para o fortalecimento de normas, legislações, programas de Integridade Pública no âmbito da Administração Pública que buscam aprimorar e/ou fortalecer o controle exercido pela Administração Pública Brasileira. O que digamos até aqui tudo bem ao considerar as finalidades assim expressas.


No entanto, há dois pontos de reflexão que se mostram, inicialmente, importantes de serem sinalizados. O primeiro se destina mais precisamente aos agentes públicos e aos órgãos governamentais sejam eles com as funções precípuas de fiscalização e controle ou não. Assim, é salutar refletir até que ponto a proliferação de cumprimento de requisitos, por exemplo, apresentados em Programas de Integridade atende de fato, na prática, às finalidades a que se destinam? Até que ponto não se operacionaliza de forma mecanicista respostas a relatórios sem se ater à pertinência e viabilidade dos critérios apresentados ou referenciados? E assim se inicia um processo burocrático em sentido lato sensu (não weberiano) de cumprimento de providências administrativas obrigatórias que apenas ocupam a agenda dos agentes públicos. Criação de cartilhas, manuais, planos que devem ser cumpridos absorvendo o tempo destinado a outras funções finalísticas dos agentes públicos.


Não obstante esse aspecto de caráter mais operacional se desenvolve ainda no campo da Gestão Pública um sentimento de aversão ao erro e de escusa de responsabilidades como por exemplo no caso de assunção de encargos relacionados à gestão e à fiscalização de contratos administrativos. Além disso, tal clima contribui para inibir práticas inovadoras no campo da Administração Pública Brasileira. Pois, os agentes públicos temem serem responsabilizados ao buscar inovar ou propor soluções que não estejam previamente dispostas, autorizadas ou reguladas em termos de normas ou procedimentos.


E o segundo ponto de reflexão reside em repensar uma compreensão ingênua entre mecanismos de controle e corrupção. Devemos analisar de forma cuidadosa a relação entre mecanismos de controle, accountability, transparência e diminuição em termos de práticas de corrupção ou de malversação do dinheiro público. Ter mais mecanismos de controle implica necessariamente em uma diminuição da corrupção brasileira? Tais questões devem ser inquietações para pesquisadores e estudiosos deste amplo tema. Razão pela qual nossas pesquisas devem ser capazes de investigar se a implementação de tais práticas, iniciativas de fato conseguem atenuar a corrupção (o que é algo complexo de mensuração em termos de reais).


Tal provocação merece reflexão e investigação, pois nos faz questionar a relação que por vezes estabelecemos de forma direta e sem críticas de que quanto mais mecanismos e agências de controle menor serão os níveis de corrupção. O que pode não vir a ser uma verdade, pois esta relação não é uma relação direta de causa e efeito. Ela possui inúmeras variáveis e distorções na prática que não permitem que tal afirmação seja estabelecida como uma verdade.


Por fim, é importante ressaltar que o ponto não reside em se apresentar contrário às iniciativas relacionadas à integridade pública, à transparência pública, às práticas de combate à corrupção. Uma vez que tais práticas contribuem para a confiança da sociedade nas instituições, no zelo e compromisso com os recursos públicos, para o exercício da cidadania e da participação social. Mas de agir com prudência, sensatez, pensamento crítico elementos cruciais para que não se possa paralisar a Administração Pública Logo, conforme diz o ditado popular "Cautela e canja de galinha não faz mal para ninguém".


*Plínio dos Santos Souza, doutorando em Administração (UFV), analista de gestão (Fiocruz)


*Josiel Lopes Valadares, doutor em Administração (UFLA), professor do Departamento de Administração (UFV)


Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção


Esta série é uma parceria entre o blog e o Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Os artigos têm publicação periódica


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