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tayane16

Liderança empresarial para um momento de transição acelerada


Depois de um delicioso lobster roll num dia ensolarado em Boston, chego para participar de um evento do professor Michael Porter, aquele mesmo das 5 forças competitivas, mestre do marketing e da competitividade. Foi num hotel no famoso Porto de Boston, vento e frio típicos da cidade.


Uma das atividades mais esperadas era o talking show entre o humorado Alan Murray, CEO da Fortune, com o CEO da GAP, Art Peck. Com sua habilidade de jornalista, Murray conduziu prazerosamente aquela conversa de 30 minutos sobre desafios contemporâneos de um líder empresarial. O que mais me chamou a atenção foi uma anedota trazida por Art Peck sobre uma fala de um ex-ceo de sua companhia numa confraternização. Disse ele, que o senhor o olhava com certo desalento e, curioso pelo motivo, foi questioná-lo. Num tom jocoso, sorriso no canto na boca, disse: sabe, meu filho, na minha época era muito mais fácil ser CEO.


Na minha interação diária com CEOs e conselheiros de grandes empresas sempre escuto diferentes versões da percepção da complexidade de liderar nos dias de hoje.

Fato é, que liderar uma empresa nas décadas de 1980-90, apesar de crises econômicas e intenso processo de globalização vivido pelo mercado, era menos complexo devido à expectativa com relação àquele líder ser uma só. Atingir o resultado financeiro esperado pelos acionistas.


O mundo mudou. O pensamento de Milton Friedman que talvez mais do que grandes ideias, tenha servido de desculpa para um capitalismo desenfreado, mostrou-se inadequado para a contemporaneidade.


É incontestável que nesse período o mundo prosperou financeiramente, mas a um custo ambiental enorme e desigualdade galopante. Símbolo maior do neoliberalismo, os EUA tiveram um aumento de 80% do PIB no país desde 1980. No entanto, apenas 20% de acréscimo na renda dos mais pobres enquanto os mais abastados experimentaram um salto de 420%.


Estamos num momento crucial de intensas crises do clima, da biodiversidade e da poluição. Como intitulado, recente relatório, Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) precisamos “Fazer as Pazes com a Natureza”. Segundo a agência da ONU, “apesar de uma queda temporária nas emissões devido à pandemia, a terra está caminhando para um aquecimento global de pelo menos 3°C neste século. Mais de 1 milhão das 8 milhões de espécies vegetais e animais estão em alto risco de extinção, e as doenças causadas pela poluição matam cerca de 9 milhões de pessoas prematuramente a cada ano”.


Esticamos a corda até quase arrebentar, se não arrebentou.

Como consequência, estamos vivendo crises sociais, econômicas e uma profunda crise intergeracional.


Em 2019, mais de 40 países passaram por grandes convulsões sociais, sendo que a previsão para 2020 era de mais de 70 nações vendo sua população ocupar as ruas exigindo mudanças no quadro político, exigindo, principalmente, a redução nas desigualdades e acesso aos diretos básicos universais.


Antes da pandemia, gretas (Greta Thunberg – ambientalista climatica) e amandas (Amanda Costa – ativista socioambientalista brasileira) tomaram as ruas do mundo todo aos milhões exigindo ação contra a mudança do clima. Greta foi bastante clara: “vocês roubaram meus sonhos e minha infância com suas palavras vazias. As pessoas estão sofrendo. Pessoas estão morrendo. Ecossistemas inteiros estão entrando em colapso. Estamos no início de uma extinção em massa e tudo o que você pode falar é sobre dinheiro e contos de fadas de crescimento econômico eterno. Como você ousa!”


Tenhamos clareza que falou não por ela, mas por uma geração.

E como sair desse imbróglio? O intenso processo de minimização e difamação do Estado ao longo das últimas décadas fez com que as pessoas não acreditem nos seus governantes. O barômetro da confiança mostra que em apenas 9 de 27 países as pessoas confiam no governo. Curioso notar que alguns desses países são ditaduras.


Os governos foram desacreditados. Estamos vivendo uma crise de confiança! No Brasil apenas 27% das pessoas acham que os líderes dos governos fazem o que é certo, enquanto 66% entendem que o CEO do seu empregador toma as decisões corretas.

Consequentemente, a mesma pesquisa mostra que 90% dos brasileiros e brasileiras esperam que CEOs se manifestem com relação aos desafios da sociedade.

Fazendo as contas dos dados que temos até agora, as empresas foram chamadas à baila para atuarem mais fortemente junto à sociedade.

Está previsto em lei que empresas devem cumprir seu papel social. A pergunta que paira hoje em dia é: qual é esse papel?


A segunda pergunta: é os líderes, conselheiros e executivos, estão preparados para esse desafio?


Senhores, estão preparados? – “senhores” por que o quadro executivo das 500 maiores empresas no Brasil ou da SP500, assim como, dos conselheiros de administração é formado por, aproximadamente, 90% de homens brancos.


Uma pesquisa do Pacto Global das Nações Unidas em parceria com a Russel Reynolds mostra que 92% de mais de 2000 CEOs acreditam que internalizar questões sociais, ambientais e de governança nas empresas é crítico para o sucesso. No entanto, apenas 21% dizem que suas empresas estão sendo efetivas nisso. Temos aqui o que chamamos de lacuna de retorica. Importante, mas não fazem. Isso pode levar a várias conclusões, como, pode ser que falam o que não acreditam ou a falta de preparo para encararem o desafio.

Na interação com CEOs, conselheiros e conselheiras, percebo que há certo reconhecimento da importância de temas ESG, mas ainda não entenderam o novo Zeitgeist. Muitos ainda estão na fase da negação.


Nessa linha, a pesquisa da Russel mencionada acima, aponta que os líderes necessários para essa transição demonstram quatro atributos críticos: Pensamento sistêmico multinível, Inclusão das partes interessadas, Inovação disruptiva e Ativação de longo prazo.


Perfil dos executivos brasileiros traçado por Betania Tanure mostra apenas 7% dos executivos brasileiros dos mais de 500 CEOs analisados são CEO estadista. Esse perfil, segundo sua metodologia, possui capacidade de gerar resultado para o negócio, um olhar para cuidar do time, e uma visão sistêmica de como contribuir para os problemas da sociedade. Estenderia isso aos conselheiros.


Tão conhecido por seus livros de estratégia, o professor Michael Porter, desde os anos 2000 esclarece que empresas precisam atuar mais junto à sociedade, o seu evento foi justamente sobre a transição da economia de acionistas para a economia de stakeholders. Termo insistentemente trazido por Klaus Scwab, fundador do Fórum Econômico Mundial.


Larry Fink, fundador e CEO da BlackRock – empresa com 9 trilhões de dólares sob gestão – comentou sobre a guinada em direção à sustentabilidade que não fez nada de muito inovador senão, escutar a sociedade.


O mesmo porto em Boston foi palco da Festa do Chá, uma rebelião de imigrantes das colônias que entendiam gozar de poucos direitos, e que o produto do seu trabalho servia a um único objetivo: enriquecer a metrópole. Esse é um dos momentos mais importantes na construção do movimento que levou à independência dos EUA.


Não se enganem, também estamos num momento de disrupção. Temos que, como líderes empresariais, escolher o lado da história.


*Carlo Pereira é diretor executivo da Rede Brasil do Pacto Global da ONU. No Pacto Global da ONU, é membro do Conselho Global das Redes Locais e lidera o Conselho Regional na América Latina e Caribe.

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