Na abertura de trabalhos do Congresso Nacional, o governo apresentou trinta pautas prioritárias para 2021: nenhuma delas encampa o combate à corrupção. Infelizmente, nossas casas legislativas são uma grande decepção neste tema. A conduta de muitos parlamentares do Congresso Nacional é puro escárnio. Dois exemplos recentes: o senador Chico Rodrigues (DEM-RR) está licenciado do cargo pois foi flagrado pela Polícia Federal com R$ 33 mil escondido entre as nádegas em operação para apurar um suposto esquema criminoso de desvio de recursos públicos em Roraima. A deputada Flordelis (PSD-RJ) não foi afastada de seu cargo pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados e permanece caminhando tranquilamente pelos corredores do Congresso, apesar de já estar com tornozeleira eletrônica como consequência do processo em que é acusada de ser mandante do assassinato do próprio marido.
Como os parlamentos das nações mais avançadas atuam no combate à corrupção? Para responder essa pergunta, um conjunto de parlamentares do mundo todo formou em 2002 a Global Organization of Parliamentarians Against Corruption (GOPAC). De acordo com o grupo a corrupção é a maior ameaça ao ideal democrático de autogoverno, pois mina o desenvolvimento econômico, viola a justiça social e destrói a confiança nas instituições do Estado. Como a corrupção tem efeitos destruidores e causas complexas, o GOPAC apresenta possibilidades de ação para parlamentos comprometidos na agenda anticorrupção.
As estratégias vão além da produção legislativa e se agrupam em, pelo menos, seis eixos: (1) os parlamentos devem destacar o combate à corrupção em cada uma de suas responsabilidades centrais, isto é, legislação, fiscalização e representação; (2) como integridade financeira é central nos esforços anticorrupção, é essencial que os parlamentos devotem atenção direta ao ciclo orçamentário (planejamento, legislação, implementação e auditoria); (3) o parlamento deve cooperar com agências especializadas bem como organizar suas próprias comissões anticorrupção; (4) é necessário fixar boas práticas contra a corrupção nas regras de financiamento partidário (especialmente no financiamento eleitoral); (5) o parlamento deve criar espaços, canais de comunicação e possibilidades de participação dos cidadãos no combate à corrupção; (6) os códigos de ética e conduta devem ser cumpridos à risca pois performam duas funções: internamente, estabelecem as balizas para o comportamento dos legisladores; externamente, resguardam o liame mínimo de confiança entre os cidadãos e os legisladores. Assim, a autodisciplina parlamentar e a autocrítica são cruciais. Obviamente, a legitimidade da democracia não depende apenas da integridade dos partidos políticos, mas dos parlamentares individualmente considerados.
A corrupção é sempre uma indicação de governança pobre, instituições fracas e parlamentos negligentes.
*Davi Lago é coordenador do grupo de pesquisa Cidades Transparentes do LABÔ/PUC-SP.
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